‘Enem dos Concursos’ relaciona o agro à exploração predatória da terra
Presidente da ABMRA critica a questão e defende uma abordagem mais justa ao setor
O Concurso Nacional Unificado (CNU), também chamado de “Enem dos Concursos”, aplicado no último fim de semana em todo o país para a seleção de funcionários públicos, trazia uma questão relativa a terras indígenas. A pergunta criticava o que foi considerado como “exploração predatória da terra”, relacionando o agronegócio a essa prática
De acordo com o presidente da Associação Brasileira de Marketing Rural e Agro (ABMRA), Ricardo Nicodemos, a questão parte de um enunciado equivocado e de uma visão que não representa o pensamento do setor.
Ele destacou que o problema é reflexo de um cenário mais amplo, em que as instituições de ensino passam uma imagem distorcida do agronegócio. Ele citou um estudo recente da Fundação Instituto de Administração (FIA) da Universidade de São Paulo (USP), que revelou que 60% das referências ao setor nos livros didáticos são negativas. “Precisamos unir o setor e trabalhar para levar o conhecimento real à sociedade urbana”, declarou.
Além disso, o presidente da ABMRA apontou que o exame reproduz uma percepção equivocada sobre a relação entre indígenas e o agronegócio. “Hoje, temos índios que trabalham e sobrevivem no setor, produzindo café e cacau de excelente qualidade. Os indígenas fazem parte do agronegócio, e o setor os acolhe muito bem”, disse.
Nicodemos ressaltou a necessidade de o setor se unir contra informações falsas, como as que estavam presentes no concurso. Ele mencionou o Projeto Marca Agro do Brasil, que visa monitorar e combater as fake news relacionadas ao agronegócio. “O setor tem que reagir a esse tipo de situação”, concluiu.
Confira a questão polêmica do ‘Enem dos Concursos’
A questão de número 7 do Concurso Nacional Unificado trazia o enunciado e as alternativas de resposta abaixo. Pelo gabarito, a opção correta seria a “e”:
“No contexto da redemocratização política do Brasil, em especial em função da promulgação da Constituição Federal de 1988 e graças à mobilização da sociedade civil e de lideranças indígenas, observou-se a ampliação do direito à proteção e ao usufruto das terras dos povos originários.
É muito comum nos depararmos com afirmações de que, no Brasil, ‘há muita terra para pouco índio’, geralmente acompanhadas de assertivas segundo as quais as populações indígenas e tradicionais são um ‘entrave ao desenvolvimento’.
Em função desse modelo de desenvolvimento, voltado para a exportação de produtos primários, os povos indígenas continuam sendo considerados um empecilho ao desenvolvimento, mas um desenvolvimento praticado de forma predatória, ao bem dos interesses particulares de poucos, e não do interesse comum.
Levando em conta o texto acima, a noção de que “há muita terra para pouco índio:
(a) sustenta-se numa premissa nacional-desenvolvimentista, cuja atualização em nossos dias tem como principal objetivo a produção de riqueza e sua distribuição mais equânime, justa e igualitária.
(b) fundamenta-se no reconhecimento da natureza conservacionista dos povos originários, que representam um obstáculo ao desenvolvimento sustentável do país.
(c) legitima-se pelo avanço do agronegócio no Brasil, uma vez que concorre para a ampliação das fronteiras agrícolas, na mesma medida em que contribui para a proteção do direito à terra e para a manutenção dos modos de vida dos povos originários.
(d) justifica-se pela condescendência da legislação indigenista, própria da constituição federal de 1988, a qual privilegia os povos originários.
(e) relaciona-se com uma certa concepção de desenvolvimento, associada a um tipo de exploração predatória da terra, da qual decorre desacertadamente que o reconhecimento da propriedade indígena representaria um suposto entrave à economia sustentável do país.“